23.7.14

Malaysia Airlines, vôo MH-17 — Perguntas e Respostas

Reproduzindo texto do site Meio Bit
(Por Carlos Cardoso em 21 de julho de 2014, no link: http://meiobit.com/293003/malaysia-airlines-voo-mh17-perguntas-e-respostas/)

No dia 17 de julho uma agência de notícias russa noticiou a queda de um avião de passageiros na Ucrânia, próximo à fronteira com a Rússia. Minutos depois a queda foi confirmada por sites como o FlightRadar24, que acompanha em tempo real vôos no mundo todo, e o respeitado AVHerald, que informou mais detalhes, como as coordenadas onde o Boeing 777-200ER parou de enviar sinais de transponder.

A violência do acidente, sem contato, aviso ou pedido de socorro trouxeram à mente de todo mundo com mais de 30 anos casos como o 747 de Lockerbie. Aviões não explodem no ar, a não ser quando há explosivos envolvidos. 298 pessoas morreram e o mínimo que se espera é saber o motivo.

O consenso foi que o avião foi derrubado ou abatido. Aí começou o disse-me-disse. Vamos tentar esclarecer alguns pontos, já que a internet E a mídia se tornaram um poço de desinformação. Atente para o fato de que só trataremos das questões mais plausíveis, os maiores malucos ficarão de fora.

1 — A Ucrânia está em guerra, como deixam aviões passarem por lá?

Tenho uma má-notícia, Poliana. O mundo está em guerra. Até o Paraguay tem uma insurgência.  O Aeroporto de Trípoli, no dia 13, foi invadido...rebeldes em ofensiva invadiram e no pega-pra-capar 90% dos aviões foram destruídos. Nem por isso a Líbia fechou seu espaço aéreo. A Ucrânia recentemente passou uma recomendação que aviões sobrevoando o país ficassem acima de 30 mil pés, pois rebeldes estavam derrubando helicópteros e transportes militares voando baixo. A rigor é uma recomendação inócua, as forças envolvidas não têm qualquer interesse em atingir a comunidade internacional, e de qualquer jeito um míssil de ombro como o SA-24 Grinch com muita sorte alcança 11 mil pés, ele é muito mais usado contra helicópteros.

Fechar o espaço aéreo de um país é algo muito sério e raro, economicamente é um desastre. Achar que os rebeldes poderiam destruir um avião de carreira assim é o mesmo que fechar a Avenida Paulista pois os Black Blocs podem coletar 2 milhões de gatinhos, soltar na rua e os motoristas os iriam atropelar (os gatinhos, não os Black Blocs). É possível? SIM. Provável? Muito pouco.

2 — Mas, mas… não há como derrubar um avião a 33 mil pés!

ORANDO realmente não, por isso a arma aparentemente usada para derrubar o MH-17 foi um brinquedo muito mais sério, o SA-11 Buk:

SA-11

Durante a Guerra Fria os soviéticos sofreram com vôos do Avião Espião Banda do Bono, que por muito tempo ficou acima da altitude máxima dos caças inimigos, até um dia em 1960 quando Francis Gary Powers descobriu da pior forma que os russos haviam aperfeiçoado o S-75, um missil capaz de atingir os 70 mil pés de altitude em que ele voava. De lá para cá se mostrou essencial desenvolver sistemas de mísseis capazes de derrubar aviões inimigos de alta performance.

O Buk é um desses sistemas. Criado em 1979 e constantemente aperfeiçoado, hoje conta com mísseis voando a Mach 4 e é tão bom que durante um arranca-rabo com a Geórgia em 2008 3 caças Su-25 e um bombardeiro Tupolev Tu-22 foram derrubados. Os russos desenvolveram uma arma tão boa que nem eles mesmos sabem como desabilitar.

3 — Mas os rebeldes não têm SA-11s

Err… Tem. Ao menos segundo uma fonte capitalista e tendenciosa como a agência de notícias TASS, que dia 29 de junho noticiou que rebeldes haviam tomado controle de uma unidade de defesa aérea da Ucrânia, se apossando de diversos equipamentos, inclusive sistemas Buk, o nome russo do SA-11.

Alguns dias antes, um dos perfis rebeldes no Twitter publicou uma foto de um SA-11, se gabando de terem capturado o equipamento.

Outro tweet, postado no dia do acidente celebra a derrubada de um avião de transporte ucraniano, com vídeo da queda do que hoje sabemos ser o 777.

Que os rebeldes dispõe desse tipo de arma, é fato. No dia 14 de julho, três dias antes do MH-17 cair um transporte An-26 ucraniano foi derrubado a 21 mil pés de altitude. No dia 14 de junho um Il-76MD foi derrubado matando 49 pessoas. 6 de junho, rebeldes acertaram um An-30, matando 5 de 8 ocupantes. E nem vou falar dos helicópteros, que foram feitos pra cair mesmo.

Os tweets, claro, foram removidos depois que descobriu-se que o avião derrubado dia 17 não era um alvo militar.

4 — Então os rebeldes endoidaram?

Não. Há relatos de que a liderança rebelde não gostou NADA do que aconteceu. A briga deles é com a Ucrânia, e a da Ucrânia é com a Rússia, por apoiar os rebeldes, que são bem diferentes daqueles Spetnaz russos que invadiram a Criméia, sem insígnias e fizeram uma ocupação militar altamente profissional. Os rebeldes que surgiram em outras regiões são desorganizados, a maior facção é a República Popular de Donetsk, comandada por Alexander Borodai, um sujeito que é basicamente um clichê ambulante. Sério, ninguém mais tem moral de reclamar dos vilões de Call of Duty e similares.

O cenário mais provável no momento, com as informações que temos, é que os rebeldes se animaram com os abates anteriores, ficaram ágeis no gatilho e como cada grupo trabalha isolado, sentaram o dedo e correram pra tuitar. Quando viram a hagada, correram pra apagar os posts (onde eu vi isso antes?) e fingir que não era com eles. Mesmo o mais bêbado dos rebeldes (segundo jornalistas russos) sabe que abater um avião com 298 inocentes é quase tão ruim pra imagem do movimento quanto recontratar o Dunga.

5 — Os ucranianos dizem que foram os rebeldes, dá pra confiar?

A rigor, não. Antes que os corpos começassem a cair atravessando o telhado da casa das pessoas (isso não é um exagero) o governo ucraniano já sabia quem, quando, onde, como e a marca da cueca de Vladmin Malvadin, o rebelde que apertou o botão e lançou o míssil. Em horas já tinham até uma gravação onde rebeldes discutiam o caso, falando que foi um acidente mas que se dane, etc. Perguntando sobre a fita, um ex-agente da CIA comentarista da CNN disse o óbvio: isso NUNCA acontece. Esse tipo de informação suculenta não cai no colo das pessoas. Como disse Tom Clancy, ao comentar os serviços de inteligência em Soma de Todos os Medos, o filme baseado no livro dele que os roteiristas ignoraram, “ninguém é tão bom assim”.

O que não quer dizer que a Ucrânia esteja errada. Mesmo um relógio quebrado está certo duas vezes ao dia. Na Segunda Guerra fugitivos de campos de concentração eram sistematicamente ignorados pelos aliados, que trataram as histórias como propaganda polonesa para forçar uma ação maior da Inglaterra. Só mais tarde, com relatos confiáveis e fotos aéreas toda a verdade apareceu. Ou seja: é provável que os rebeldes tenham derrubado o avião e é bem provável que a Ucrânia esteja criando provas falsas pra enfatizar isso.

6 — Eu li que os ucranianos derrubaram o avião para incriminar os rebeldes.

Ok. Qual a motivação? A comunidade internacional não vai se meter naquele atoleiro. Também não vai atacar a Rússia, por mais que a retórica esteja sendo pedir a cabeça do Putin, é puro marketing, igual empresas aéreas fingindo que vão alterar rotas para não passar sobre a Ucrânia. Em uma semana tops tudo volta ao normal.

Transportemos para a esfera nacional. Digamos que o Rio esteja com um problema sério de segurança. A Dilma reluta em mandar tropas federais. O Governador manda uma tropa do BOPE, vestida de bandidos do CV para explodir a Escola Municipal Pandinha Feliz, matando 786 criancinhas e dois suricatos. Dilma fica indignada e manda as tropas. Beleza, mas a carreira política do Governador ACABOU, a incompetência dele sobe a níveis estratosféricos e tudo que ele toca se torna nefasto. Isso SEM vazar nada do plano.

Não há ganho real para a Ucrânia, ela está sendo tratada já como incompetente, por deixar rebeldes roubarem seus mísseis, por deixar a Rússia roubar a Crimeia na mão-grande, por deixar rebeldes dominarem boa parte do país.

7 — Eu li que era um plano da Ucrânia pra matar o Putin, e que o avião dele passou minutos antes pela mesma rota.

Vamos lá. Primeiro, aviões presidenciais (os de verdade, não o Força-Aérea 51 que a Dilma herdou) possuem toneladas de equipamentos para detectar radares de alvo, além de contra-medidas eletrônicas e outros equipamentos. Não dá pra pegar um avião desses de surpresa, e mesmo que derrube, isso chegaria ao alto-comando em Moscow antes de Putin pousar suavemente, depois de arrancar a camisa, abraçar a aeromoça mais gostosa e usar uma porta de emergência como prancha de skysurf.

Depois de consumar o pouso e consumir a agradecida aeromoça, ele usaria seus poderes telepáticos e ordenaria um ataque nuclear a Kiev.

Tentar assassinar um Chefe de Estado é o que historiadores chamam de Casus Belli. Isso não se faz, nem em tempo de guerra. Tentar algo assim só se você estiver viajando no tempo, quando é obrigatório tentar matar Hitler, ou se seu plano for absolutamente completamente totalmente blindado, à prova de falhas. Se respingar a menor suspeita, você jé era, e nesse caso a Ucrânia estaria com o revólver fumegante na mão.

Para enterrar a conspiração de vez, o principal interessado em complicar a vida da Ucrânia jogou água na fogueira. Segundo o Russia Today, aquele tablóide pela-saco de Obama…

putindomal
“Faz tempo que o avião presidencial russo não voa sobre a Ucrânia.”

8 — Me falaram que o avião foi derrubado por Israel para desviar a atenção dos ataques em Gaza

Quais? Aqueles que ocupam exatamente METADE do noticiário internacional, e até um zé-ruela joão-ninguém maluco de conspiração do Twitter conhece?

Uma operação como a que está ocorrendo em Gaza leva semanas, às vezes meses pra ser planejada. Claro, como judeu burro nasce goy, o MH-17 foi uma coincidência bem-vinda, e muito provavelmente o ataque foi adiantado em alguns dias, mas o ganho é mínimo, Israel está se aproximando do status de pária internacional que tinha na época da Guerra dos Seis Dias, com ou sem avião.

De resto a logística necessária para Israel derrubar secretamente um avião na Ucrânia é algo que nem os teóricos da conspiração conseguem imaginar, a não ser os mais insanos, que AFIRMAM que Israel sequestrou o MH-370 na Indonésia, deixou num hangar por 4 meses e então derrubou sobre a Ucrânia. Excelente teoria (o médico manda não contrariar) mas não explica detalhes como… onde foi parar o MH-17. Eu prefiro a história de que o MH-370 foi derrubado para a mídia brasileira parar de mostrar os Black Blocs e prejudicar o PT. Ou a do JÊNEO que falou que o avião foi derrubado para… prejudicar os BRICS.

9 — Como isso aconteceu? Nunca antes na história desse país…

Sorry, lamento informar mas a História não começou no dia em que você começou a assistir Show da Eliana. Citando apenas os casos mais clássicos:

1955 — Um Constellation da israelense El Al voava de Viena para Tel Aviv, via Istambul. O piloto errou, sobrevoou a Bulgária, recusou ordens para pousar. Foi abatido por dois MIG-15.

1973 — Um Boeing 727 da Líbia Airlines indo pro Egito invadiu espaço aéreo israelense. Mesma coisa. Se recusou a pousar. Foi derrubado por 2 Phantoms F4.

1978 — Um Boeing 707 da Korea Airlines invadiu espaço aéreo russo, foi derrubado.

1983 — OUTRO Boeing da KAL, dessa vez um 747 foi derrubado pelos russos, que acusaram o avião de ser um vôo espião. Entre os “agentes secretos” a bordo, 269 passageiros e um congressista americano.

1988 — O destróier USS Vincennes, da Marinha dos EUA via uma imensa série de erros confundiu um 747 iraniano com um caça F-14, no final abateu um avião de passageiros com 290 pessoas a bordo.

Agora a mais irônica de todas:

2001 — Um Tu-154 da Siberia Airlines levando 66 passageiros e dois tripulantes foi abatido sobre o Mar Negro. A arma foi um míssil S-200 lançado pela Ucrânia durante um exercício. Sem sobreviventes.

Fonte, com 24 casos listados.

10 — Os aviões não tem como identificar esses mísseis?

Se for um avião militar, sim. Aí você tem alternativas. Se estiver em um caça Stealth, começa a rir. Se estiver em um caça normal, verifique se está dentro do envelope do míssil. Se estiver, manobre feito um louco pra tentar escapar. Se estiver em um SR-71 Blackbird, a recomendação do manual é “acelere e siga em frente”.

Um avião comercial não tem sistemas de identificação de mísseis primeiro por nunca ter sido necessário, segundo por não fazer diferença.

“Senhores passageiros, detectamos um míssil vindo em nossa direção. Por favor coloquem seus passaportes entre os dentes para facilitar a identificação, e de qualquer jeito já morremos pois ele leva 9,7 s voando a Mach 3 para nos atingir e falar esta frase levou mais tempo que isso. Obrigado por voar com a Jack Dalton Airlines.”
♮  
11 — Os EUA não têm como identificar esses mísseis?

Sim e não. Teoricamente o sistema de alerta de lançamentos ainda não esteja funcionando, é algo que investiram bastante desde a 1ª Guerra do Golfo, quando Scuds se mostraram muito mais preocupantes do que imaginavam. Os EUA se prepararam para uma guerra nuclear com a URSS, então só se interessavam em detectar lançamentos de mísseis grandes. Quando a ameaça se tornou um maluco que poderia encher uma ogiva de CS, Sarin, Antraz, Dolly ou outra arma quimico-biológica qualquer, não estavam prontos pra esse tipo de ameaça.

Com sistemas de aviões-radar AWACS e monitoramento de infravermelho é possível detectar lançamentos, e os EUA afirmaram categoricamente que detectaram um SA-11 sendo lançado da região controlada por rebeldes. O problema é que teoricamente não há AWACS ou drones em território ucraniano. Revelar exatamente quem, quando e onde entregaria as capacidades de inteligência dos EUA. Fazer os russos passar vergonha é legal mas não vale revelar uma carta dessas.

12 — Os russos não têm como identificar esses mísseis?

Tem. Só que não interessa ao Putin dar munição pra Ucrânia. Não que ele ame rebeldes, eles já fizeram seu papel, ele pegou a Criméia e era o que queria. Se vier mais uma ou outra região é bônus, mas não terá problema nenhum em jogar os caras na frente do trem, se ficar acuado. Por isso ele está pedindo “investigação internacional” e outros esforços de cooperação que tradicionalmente dão em nada, por virarem pesadelo de jurisdição. Uma boa jogada foi com os gravadores de vôo, capturados pelos rebeldes, que queriam entregá-los para os russos.

Moscou, em um gesto de “grandeza” declarou que não iria ficar com as caixas-pretas, que se as recebesse repassaria para especialistas internacionais. Imediatamente os rebeldes mudaram o discurso e agora os gravadores sumiram.
// BREAKING NEWS: o 1º ministro da Malásia diz que serão entregues pelos rebeldes hoje às 21 h. E foram.//

Putin está provocando a fundo a Ucrânia, agora um oficial russo apareceu afirmando que radares captaram dois caças ucranianos voando muito próximo do MH-17, mas nenhum lançamento de míssil de terra. Sim, no disse-me-disse internacional a Rússia acusa a Ucrânia de derrubar o avião. Tudo bem, a mídia não está pegando leve com ele também.

13 — Haveria como evitar essa tragédia?

Sim. Aviões, exceto os Legacy transmitem constantemente sua posição e códigos de identificação. É o chamado Squawk, um código do transponder que identifica se você é um avião civil, foi sequestrado ou “estou transportando Justin Bieber, por favor abata este avião”. Acho que no caso é o Squawk 0666.

O problema é que somente operadores devidamente treinados sabem identificar esses códigos, o provável é que os rebeldes não tenham percebido ou sequer entendido o que estavam vendo. Não existe sistema à prova de idiotas.

14 — Agora todo grupo terrorista vai sair derrubando aviões?

Não. Sistemas como o SA-11 não são encontrados em qualquer esquina. Demandam treinamento e manutenção. Isso está fora do orçamento de 99% dos grupos terroristas do mundo. Amarrar C4 em fanáticos, criando as chamadas bombas não-muito-inteligentes é uma forma bem mais eficiente de dizimar os infiéis.

É impossível esconder a trilha de um equipamento desse tamanho. Se um for usado contra Rússia, EUA ou Inglaterra as forças especiais desses países seguirão o rastro do equipamento, polpificando cada um dos envolvidos, do sujeito que fez a entrega aos vários atravessadores, chegando até ao gerente da fábrica que desviou o SA-11 original. Será uma arma de um tiro só e um monte de “mártires” ~morrerão por causa dela~. Não é bom para os negócios. Por isso traficantes de armas não negociam com material radioativo.

15 — A culpa não é da Malaysia Airlines?

Não. Isso se chama probabilidade. Uma empresa pode ter 2 acidentes seguidos, pode nunca ter um acidente em 20 anos e depois dois no mesmo mês. O ato de jogar uma moeda pro alto não influencia o resultado da próxima jogada nem é afetado pela anterior. O mercado é implacável, e as ações da empresa estão no chão. As famílias vão ser indenizadas, mesmo a empresa não tendo culpa, mas as chances da Malaysia conseguir na Justiça reaver essa grana é zero. Rússia e Ucrânia nunca vão assumir culpa e processar rebeldes nunca deu muito certo.

Claro, eles também forçam a sorte, agora avisaram que não vão mais sobrevoar a Ucrânia, preferindo os ares muito mais pacíficos e amistosos da… Síria. Que comprou Buks dos russos e tentou repassar para o Hezbollah, mas foi diplomaticamente convencido, através de algumas bombas israelenses, que os Buks seriam melhor aproveitados como crateras fumegantes.

16 — O que vai acontecer?

Idealmente para Putin seria o governo ucraniano cair, assumir um gabinete pró-Moscou, mas isso não vai acontecer. Ele vai insistir na retórica de que foram os ucranianos, mas não muito. Também já está mudando o discurso e acabou de ser divulgado que a Rússia apoiará a resolução do Conselho de Segurança da ONU.

Isso mostra boa-vontade e não tem nenhum efeito prático. Se resumirá a uma carta muito, muito ríspida que ninguém sabe pra quem entregar.

Se a coisa ficar insustentável Putin escolherá um boi de piranha, jogará aos lobos esperará a situação se diluir em nada.

Exato: ninguém vai ser preso, ninguém vai ser responsabilizado e na melhor das hipóteses os rebeldes diretamente envolvidos aparecerão em algum galpão, depois de terem cometido suicídio com uma 9 mm na nuca.

17 — E as vítimas?

Essa parte é deprimente. A Europa já tinha superado a fase de encher vagões refrigerados com corpos, agora essas imagens voltam a assombrar todo mundo. Segundo jornalistas os rebeldes e voluntários tratavam o local da queda como se estivessem “limpando o jardim”. Todo o cenário forense foi comprometido. Civis saquearam os corpos e as bagagens, há cenas de gente metendo serra circular em pedaços do avião para cortar ao meio e ver o que tem embaixo.

A mídia fala de rebeldes impedindo acesso de jornalistas e recolhendo corpos, mas a situação é mais complicada. Simplesmente ninguém sabe de nada e ninguém está no comando, muito menos a Ucrânia, que não chega nem perto da região do acidente. Os rebeldes que querem ajudar (e nesse momento são todos) não sabem o que fazer. Uma operação improvisada recolheu os corpos, que ficaram um dia parados esperando alguém decidir pra onde mandar.

18 — Isso não foi um plano para impedir a cura da AIDS, que estava no avião?

Eu sei que você leu o sensacional texto do Jean Wyllys, mas acredite: por mais que Rússia e Ucrânia sejam conservadores, eles não odeiam gays tanto assim. Aliás, associar gays a AIDS em 2014 é meio puro preconceito, não?

De qualquer forma, é verdade que mais de 100 passageiros do vôo estavam indo para um congresso sobre AIDS, alguns eram bem conhecidos no meio. Quanto a levarem uma cura, não. Eu sei que todo mundo adora a idéia do cientista solitário pesquisando escondido, mas isso não existe mais. Uma pesquisa dessas seria fruto de uns 5 ou 10 papers anteriores, amplamente divulgados e conhecidos por todos. Ciência não se faz em segredo.

Todos os cientistas que se prezam fazem backups. Publicam resultados E trabalham em equipe. A pesquisa será prejudicada? Talvez, talvez não. Na pior das hipóteses, muito pouco. Há muita gente pesquisando a mesma coisa ao mesmo tempo. De resto, entre agosto de 2014 e janeiro de 2015 há nada menos que 17 congressos sobre HIV/AIDS. Se Putin quiser prejudicar mesmo a pesquisa tem muito avião pra derrubar.

19 — Eu ouvi que o MH370 passou por um vórtex temporal, apareceu na Ucrânia e foi derrubado.

Eu ouvi também. ACEITANDO que isso é verdade, caímos no velho problema das teorias da conspiração, que criam novas perguntas ao invés de responder as antigas. Beleza, o avião derrubado foi o MH370 da Indonésia. E onde está o MH-17 vindo da Holanda?

20 — World War Z

Um dos líderes rebeldes deu uma entrevista dizendo que os corpos no avião já estavam mortos. Pior, estavam sem sangue no corpo, e em decomposição antes de chegar ao solo. Será que foram invadidos por vampiros? Era um vôo fantasma?

Provavelmente não.

21 — Onde estão os celulares?

Essa é uma boa pergunta. Informações como localização de GPS, hora e até com sorte fotos ou vídeos feitos durante o ataque poderiam ser úteis para a investigação, mas é muito mais provável que essa hora estejam em uma banquinha da Robauto de Donetsk. Essa é a parte ruim de uma área de desastre sem controle. Mesmo assim é muito melhor do que acidentes em alto-mar ou em florestas. Com sorte os investigadores internacionais, que estão começando a ter acesso ao local, acharão um Nokia 3310 que protegeu com seu corpo um iPhone e algo será apreendido.

22 — Ainda é seguro viajar, mesmo pela Ucrânia?

Em 2012 tivemos 9,8 MILHÕES de vôos. Isso dá 816.666 vôos por mês. Mantendo esses valores para 2014, com 5.716.662 vôos e 2 acidentes fatais até agora, dá pra ver que não estamos falando exatamente de uma roleta russa com pistola. Em termos de fogo acidental eu diria que a Ucrânia é o lugar mais seguro do mundo neste momento. Ninguém está chegando nem perto dos mísseis, o medo de repetir a hagada é grande demais. Vai todo mundo focar em controle de danos e rezar pra alguma outra desgraça acontecer e desviar a atenção mundial. 

23 — Qual a grande conclusão dessa história?

Nossos brinquedos estão ficando mais letais. Nos velhos tempos o máximo que você podia roubar era um mosquete. Mesmo que uma nação revertesse ao caos, um grupo de indivíduos conseguiria um canhão. Hoje equipamento sofisticado pode cair nas mãos erradas, causando muito mais dano. Se o PCC invadir uma unidade do Exército e rouba um sistema Astros 2020, poderia dizimar um estádio lotado. O que ainda seria tragédia menor do que aquela goleada alemã de 7 × 1 na seleção.

A tecnologia aumentou nossa capacidade, tanto para o bem quanto para o mal. Uma espada não tem moralidade implícita. Pode ser usada para defender sua família de um urso, e pode ser usada para decapitar um Stark. Nossas espadas se tornaram maiores e mais afiadas, mas a mão que as empunha é a mesma. Assim como o coração que as comanda. E isso pode muito bem ser nossa derrota final.

Fonte: http://meiobit.com/293003/malaysia-airlines-voo-mh17-perguntas-e-respostas/

Um comentário:

Anônimo disse...

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