26.8.16

"STJ diz que transporte aéreo é essencial, e a ANAC que fique esperta!"

por Marcelo Oliveira

"O caso envolveu cancelamentos, citados como sistemáticos e consecutivos na comarca de Cruzeiro do Sul/AC, cidade com grandes dificuldades para locomover e transportar seus cidadãos.

O Ministério Público do Acre havia ingressado com uma Ação Civil Pública em face da GOL discutindo falhas no fornecimento do serviço de transporte aéreo, quando então conseguiu que judicialmente a aérea não cancelasse voos naquele Estado, salvo por razões técnicas e intransponíveis justificáveis.

O caso teve recurso apresentado pela cia aérea que foi para o STJ – Superior Tribunal de Justiça – apreciar e este o fez conforme trechos do Min. Humberto Martins, como segue:

“O Código de Defesa do Consumidor não prejudica as normas do setor aéreo brasileiro… Ao cuidar da oferta nas práticas comerciais, o Código de Defesa do Consumidor evidencia o dever de informar (art 31). As infrações às relações de consumo são constantes, porque para o fornecedor lamentavelmente o custo do dano será menor que o lucro obtido.”

Como informado no Portal Migalhas,  sobre o tema: “A GOL alegou que a obrigação determinada no acórdão seria perpétua, ao que Humberto respondeu no voto que, embora não caiba ao Judiciário determinar a realização de voos perenes para esta ou aquela cidade, “cabe sim ao Judiciário determinar o cumprimento do contrato de concessão celebrado entre o poder concedente e a concessionária. E foi isso que as instâncias ordinárias estabeleceram. Também cabe ao Judiciário zelar pelo cumprimento de contratos entre a companhia aérea – concessionária de serviço público – e os consumidores”.”

Também de extrema relevância trechos da decisão do Min. Herman Benjamin do da 2.ª Turma do STJ que acompanhou integralmente o voto do Min. Humberto Martins e ainda enfatizou, como segue:

Nunca tivemos a oportunidade de dar o veredicto do STJ sobre essas práticas abusivas, corriqueiras que ocorre no Brasil inteiro e não apenas com a GOL. A questão é mais grave aqui porque estamos tratando de uma cidade que contava, em 2009, com apenas esses voos, de uma única companhia aérea. E sabemos que é cidade que boa parte do ano tem a sua estrada de ligação a Rio Branco interditada.”

“A regra é que o órgão regulador só é chamado de forma excepcional. Se fosse assim, todas as ações, e são centenas de milhares de ações, inclusive nos Juizados Especiais, em razão de telefonia, de água, de eletricidade, teríamos que chamar os órgãos estaduais ou federais de regulação. Acabaria a competência da Justiça estadual.”

“Diria até que numa circunstância como essa, de Cruzeiro do Sul, o serviço de transporte aéreo não é essencial, é essencialíssimo, uma categoria que o Código não previu, mas igual a categoria do hipervulnerável. Evidentemente que daí saem consequências desta tese. Se são essenciais, são contínuos. Contínuo não quer dizer eterno. O Poder Judiciário não pode ser o gestor da malha viária do Brasil. Não pode e não quer. Mas é gestor das obrigações e dos direitos decorrentes da malha viária estabelecida pela Anac, e pode também verificar precisamente se a Anac, como órgão de Estado, está cumprindo com seus deveres de regulação ou se transformou em órgão capturado pelo regulados.”

“A oferta e a violação à essa oferta pública não é apenas para os consumidores que concretamente foram lesados (que queriam voar naquela data ou compraram o bilhete), mas é violação à oferta feita a 60, 80 mil habitantes de Cruzeiro do Sul. Naquele artigo 22, parágrafo único, quando se fala em danos, são danos materiais e morais. E como já estabelecemos nesta turma os danos morais podem ser coletivos. E serão danos morais para 80 mil habitantes.”

“Tudo isso caracteriza também prática abusiva conforme o artigo 39 do CDC. A lista do artigo 39 é exemplificativa. Há prática mais abusiva do que a empresa negar cumprimento àquilo que assumiu com o Poder Público em relação a 80 mil pessoas? É uma prática a ser reprimida pelo Judiciário o cancelamento e suspensão de voo sem informar corretamente o consumidor a razão para tanto. E tem que ser por escrito. O consumidor fica absolutamente desprotegido. E portanto essa última tese é de que é prática abusiva não informar o consumidor a razão para tanto por escrito, indicando de forma completa, explicando o consumidor exatamente o que ocorreu. Não há problema nenhum em dizer “o voo está sendo cancelado porque não há teto em Manaus”. Por que não informar isso ao consumidor? Aliás o único sujeito que detém essa informação é a empresa.”

O julgamento teve decisão unânime dos Ministros, com efeito a ser entendido e aplicado a qualquer cidade e cia aérea no Brasil…

Vejo como importante a análise do julgado, no seguintes termos:

a ANAC pode até autorizar cancelamentos, mas as aéreas não podem ‘esquecer’ de que estarão também sujeitas  à responsabilizações das regras de direito do consumidor;
da mesma forma, as aéreas devem cumprir com os contratos que celebraram, conforme malhas ofertadas pela ANAC e assumidas por estas!
e de extrema relevância o apontamento do Min. Herman quando diz que o Judiciário é competente e fiscal para verificar se a ANAC ‘está cumprindo com seus deveres de regulação ou se transformou em órgão capturado pelos regulados.’
E o dever de INFORMAÇÃO dos fornecedores aos consumidores, segue firme e contínuo!"

Fontes:

http://www.migalhas.com.br/Quentes/17,MI244204,81042STJ+realiza+julgamento+historico+sobre+essencialidade+do+transporte
http://blog.panrotas.com.br/prevenindo/index.php/2016/08/22/stj-diz-que-transporte-aereo-e-essencial-e-a-anac-que-fique-esperta/

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