9.2.09

Jet Lag - Saudades do serviço de bordo que desapareceu


"...Lendo uma matéria saudosista do The New York Times esta semana acabei me inspirando a escrever sobre algo que a maior parte dos mortais comuns não vivencia mais a bordo dos aviões de hoje. O artigo lembrava o primeiro vôo comercial transcontinental regular nos EUA, feito pela American Airlines, entre Los Angeles e Idlewild (hoje conhecido como aeroporto John Fitzgerald Kennedy, em Nova York), em 25 de janeiro de 1959. 

A primeira razão para se ter saudade, descobri logo de cara, é que há 48 anos a mesma viagem demorava menos do que hoje. Na época, eram 4h30 na proa para leste e 5h30 na de oeste, em função dos ventos. Hoje, os mesmos vôos estão demorando em média uma hora a mais para cada lado - fator atribuído ao movimento do tráfego, que atrasa pousos e decolagens com intermináveis esperas em fixos (espaços aéreos nos quais as aeronaves ficam aguardando a vez para o pouso). Ano passado, quando fui a Seattle via Nova York, o vôo quase transcontinental levou cinco horas na ida e seis no retorno. 

O vôo nº2 da AA marcou para os passageiros outro avanço importante, já que reduzia o tempo no ar em quatro horas, em relação a barulhentos quadrimotores a hélice, como o Lockheed Costellation que faziam o percurso. O NYT recuperou as impressões de quem fez a viagem na época, destacando o conforto na cabine - nesse ponto o 707 sempre foi um jato insuperável - a possibilidade de enxergar a superfície da terra de outro ângulo - era a primeira fez que se usava nível de vôo acima de 30 mil pés – e todo um serviço digno de reis. Entre as celebridades na travessia história estavam a atriz Susan Hayward e o poeta Carl Sandburg. 

Quando o artigo se refere à esse choque de conforto lembro da mesma sensação que senti quando troquei os DC-3, Viscount e Samurai YS-11 que cumpriam as rotas regionais no Brasil pelos 737. Viajava com alguma frequência para o Mato Grosso, por razões familiares, e o vôo era um suplício só considerado porque gastava-se quase um dia para um percurso que, de carro, levávamos cinco para cumprir – e em estradas de terra. Os DC-3 da Cruzeiro eram aviões robustos e seguros, mas barulhentos demais, já que eram um projeto de guerra, não de paz. Como voavam baixo, estavam sujeitos aos humores da meteorologia. Além disso, respirava-se o tempo todo aquele cheiro enjoativo de gasolina de aviação. A companhia costumava tambem usar os Caravelle nessa rota, mas não me lembro de ter voado neles.

Mais do que no 737, foi no 707 a descoberta do prazer de voar com conforto. Usei por anos a rota entre Rio e Belém do Pará e o vôo da Varig direto incluia um serviço de bordo com consomé servido em pratos de louça com monograma da empresa, com talheres de metal e guardanapos de linho. Isso sem falar no silêncio a bordo, mesmo com as quatro turbinas a plena, e na suavidade de deslizar-se a 38 mil pés, bem acima dos Cumulus Nimbus que cobrem a região Norte habitualmente. 

O artigo do NYT dá essa idéia também ao recuperar a carta de bordo distribuída aos passageiros quando no embarque: “breakfast às 10h15 sobre Grand Junction, Colorado, coquetéis às 11h26 sobre Des Moines e almoço às 12h30 sobre Cleveland”. O cardápio da rota incluia lagosta fresca do Maine, filét mignon temperado com molho amanteigado de ervas, sorvetes com maccaroons e licores. Vale destacar que o cardápio era igual para a Primeira Classe e a Econômica. Mudava apenas a apresentação. Bebidas e cigarros eram consumidos à vontade a bordo. 

Mas não se pode lembrar dessas coisas sem ressaltar que hoje, apesar dos problemas e da perda de conforto a bordo, o preço das passagens abriu o transporte aéreo a uma multidão de pessoas. Uma passagem no vôo citado pelo NYT, por exemplo, custaria hoje US$ 1.743, seis vezes mais cara que um bilhete comum atualmente. Em minhas viagens como geólogo, nos anos 80, lembro que o custo dos deslocamentos aéreos era um dos itens mais caros em todos os nossos contratos de pesquisa..."

Fonte: JB Online - JBlog Slot

Nenhum comentário: