Na época em que voar de avião não oferecia a mesma segurança de hoje, uma lourinha de 25 anos procurou Steve Stimpson, administrador-geral da Boeing Air Transit, depois United Airlines. Chamava-se Ellen Church e queria pilotar aviões.
1934. AA começou a servir refeições em caixinhas
Stimpson se surpreendeu com a firmeza da moça. Entretanto, quando descobriu que era enfermeira, achou melhor contratá-la para cuidar dos passageiros no ar. Em sua opinião, viajando com Ellen, uma profissional acostumada a cuidar de seres humanos em hospitais, muitas pessoas se convenceriam de que subir às nuvens não era tão arriscado como supunham. Além disso, algumas vezes os passageiros realmente precisavam de socorro. Os aviões não tinham pressurização, um sistema de compressores capaz de bombear ar dentro da cabine e criar condições artificiais de conforto. Os viajantes enfrentavam enormes diferenças de temperatura e o ruído quase insuportável dos motores.
Há 80 anos, na manhã de 15 de março de 1930, um trimotor da Boeing Air Transit, com capacidade para 12 passageiros, decolou de Oakland, no Estado da Califórnia, para Chicago, em Illinois. A bordo estava a ousada Ellen, primeira aeromoça da história. A novidade fez sucesso e Stimpson a encarregou de treinar outras sete enfermeiras para formar a equipe pioneira de uma profissão de elite. O salário era ótimo: US$ 125 por mês. Como os corredores do avião eram estreitos e os tetos muito baixos, as candidatas deviam ser magras e medir no máximo 1,62 m. Todas as empresas comerciais imitaram a Boeing Air Transit. Justamente por serem enfermeiras, com a deflagração da 2ª Guerra Mundial as aeromoças americanas abandonaram o trabalho civil e se alistaram nas Forças Armadas. Para substituí-las, as companhias contrataram novas profissionais, sem exigir que fossem enfermeiras. Anteriormente, o serviço de bordo era realizado pelo copiloto. Muitas vezes ele se limitava a carregar a mala do passageiro, ajudá-lo a subir a escada do avião e, para desobstruir os ouvidos no ar, oferecer-lhe Chiclets, a inventiva goma de mascar lançada em 1906 por Cadbury Adams.
A comida que as aeromoças enfermeiras entregavam era modesta. Resumia-se a um sanduíche embalado em papel encerado e café em copo de papelão. Em 1934, porém, a American Airways, depois American Airlines, adquiriu um avião Curtiss Condor, com capacidade para 18 passageiros, e introduziu comida mais substanciosa a bordo, oferecida em uma caixinha. Passados dois anos, a concorrente United Airlines, ao voar com o bimotor DC-3, com capacidade para 21 passageiros, deu o troco. Instalou em um hangar de Oakland a primeira cozinha de preparação de pratos elaborados. Em princípio, inaugurou o catering aéreo. Inicialmente, os passageiros comiam em terra, no restaurante do aeroporto. Só depois as preparações passaram a ser transportadas em recipientes térmicos, que as mantinham quentes por duas horas, e distribuídas no avião.
Dois inventos incorporados pela aviação comercial em meados da década de 40 revolucionariam a comida de bordo: a técnica de congelamento rápido dos alimentos, desenvolvida por Clarence Birdseyes, e a invenção do forno de convecção, por William Maxon. Finalmente, apareceu o revolucionário micro-ondas, descoberto acidentalmente por Percy Spencer, da fabricante de radares Raytheon. Esse forno apresentou a vantagem de descongelar os alimentos em muito menos tempo que o de convecção. Agora, nos aviões de última geração, a comida continua a ser preparada em terra, porém embarca com uma temperatura de 5°C. É aquecida a bordo, em forno a vapor, coberta por papel especial. O cuidado retém a umidade e conserva o aroma e a textura. Entretanto, persiste o problema do reaquecimento. Um alimento requentado jamais voltará a ser o mesmo. O cuidado dispensado no ar com a manipulação da comida também conta bastante.
No âmbito doméstico, a multiplicação dos voos de baixo custo e a guerra das tarifas têm difundido a praxe de o passageiro pagar a bordo pelo que consome. Em viagens internacionais, porém, a comida continua sendo um diferencial para atrair clientes, embora exista uma enorme diferença entre o que é servido na classe econômica e na executiva. No primeiro caso, as empresas de catering aéreo, ou seja, que preparam os alimentos servidos pelas companhias aéreas, recebem cerca de US$ 20 por refeição; na outra, aproximadamente US$ 50. Obviamente, voar na executiva ou na cada vez mais rara primeira classe faz muita diferença. Além das opções do cardápio, algumas vezes supervisionado cuidadosamente por chefs de renome, e da bebida à vontade, pagar o dobro do que custa viajar na econômica oferece a comodidade das poltronas que viram camas e do espaço para espichar os pés. Sim, existem coisas que mudaram pouco com o passar do tempo. Mas os brasileiros que desfrutaram do privilégio de voar na primeira classe da velha Varig ainda sentem saudades do caviar beluga que saboreavam acompanhado de legítimo champanhe francês, verdadeiramente dos céus.
Fonte: Estadão
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