27.10.08

Vôo no ritmo da turbulência

No ano passado, quando assumiu uma companhia abatida pelo maior acidente aéreo da história do país, ninguém imaginava que David Barioni Neto colocaria a TAM em vôo de cruzeiro tão rapidamente. Trazido da Gol, a principal concorrente, Barioni assumiu a presidência da companhia em novembro e, de lá para cá, só trouxe boas notícias para os acionistas da empresa.

O primeiro passo foi lançar uma nova identidade visual para a companhia e uma estratégia de comunicação mais simpática. Crescendo no vácuo deixado pela antiga Varig, em seis meses a empresa deixou para trás o trauma do acidente no aeroporto de Congonhas, em São Paulo, que matou 199 pessoas, e se consolidou na liderança do mercado brasileiro – contrariando a expectativa de analistas que viam a dupla Gol e Varig assumindo a dianteira na corrida dos céus brasileiros.

Desde que tomou posse no cargo, o paulistano de 49 anos, conhecido pela agilidade e pelo alto astral, tornou-se garoto-propaganda da empresa. Os passageiros da companhia se acostumaram a ver o rosto do presidente nos comerciais exibidos no interior das aeronaves. Também não será surpresa se o cliente encontrar o comandante da empresa a bordo. Piloto de carreira, Barioni não perdeu o hábito de operar as aeronaves e, atualmente, pode ser visto nos vôos do Boeing 777 da TAM.

O processo de amadurecimento da TAM, que há menos de 10 anos era a quarta bandeira do país, foi concluído no dia 7 de outubro, quando a empresa ingressou oficialmente na Star Alliance. Não é por acaso que a empresa decidiu se associar ao antigo parceiro internacional da Varig. Como Barioni conta na entrevista concedida logo após o anúncio, a TAM está perseguindo a credibilidade deixada pela octogenária marca criada em Porto Alegre.

Confira os principais trechos:

Zero Hora – Como a TAM está se preparando para enfrentar a crise econômica mundial?

David Barioni Neto – Lidamos com problemas de petróleo, dólar, crise internacional. A aviação é muito sensível a qualquer crise porque é multifacetada. É uma empresa de serviço, de comércio, de atacado, de logística, é importadora, é exportadora, é uma financeira. É muito difícil uma crise não afetar a aviação. No momento, estamos mantendo o planejamento estratégico da companhia. A TAM tem operações de hedge de petróleo para 50% do consumo dos próximos 12 meses, ao preço médio de US$ 105 o barril. Mantido o preço internacional do petróleo nos níveis atuais, estimamos perdas contábeis distribuídas pelos próximos 12 meses. Em contrapartida, teremos ganhos na operação, pois abasteceremos as aeronaves com combustível mais barato.

ZH – Nos últimos anos, a aviação brasileira passou por um período onde a tônica era redução de custos e serviço espartano, e o senhor fez parte desse processo como executivo da Gol. A TAM parece estar mudando de rumo em busca de serviços de excelência, mesmo que custem um pouco mais caro. A impressão é correta?

Barioni – Sim, mas isso tem de ser visto num espaço de 30 anos. Este trabalho começou com o comandante Rolim, que fundou uma empresa muito focada em serviços. Nosso principal ativo são os serviços de qualidade. Somos uma empresa de custo controlado, sempre seremos, porque a nossa margem é muito pequena. A idéia é entregar esse espírito de servir, algo intangível, que está no nosso DNA e nos diferencia dos concorrentes.

ZH – Em um passado recente, porém, a TAM reduziu o padrão de atendimento de bordo para concorrer com a Gol. Por que a decisão foi tomada?

Barioni – Naquele momento, era o melhor a se fazer devido a uma retração de mercado e à necessidade de fazer caixa. Mas isso tem de ser visto em um escopo de 30 anos. A tendência do gráfico nos 30 anos mostra a TAM investindo em qualidade.

ZH – Com a entrada da TAM na Star Alliance, cresce a sensação de que a companhia está tentando se transformar na antiga Varig. É esta a estratégia?

Barioni – É um fato. Estamos crescendo em cima de um espaço deixado, como qualquer concorrente faria. Com a saída da Varig, em 2006, abriu-se uma janela muito importante para que a gente pudesse crescer em vôos internacionais. São 154 vôos permitidos, e só fazemos 50.

ZH – O que o senhor acha das medidas da Anac para aumentar a concorrência, como liberdade tarifária para vôos internacionais?

Barioni – Somos a favor. Para que isso ocorra, no entanto, é preciso fazer a lição de casa porque carga tributária para nós é de até 62%, enquanto para empresas de fora o custo é de 30%. No Chile, é 17%. Não temos nenhum problema com a concorrência desde que as ferramentas sejam as mesmas.

ZH – Mas não é ruim para a empresa que a Anac esteja aumentando a concorrência?

Barioni – Concorrência é sempre bom. Somos uma empresa que só cresceu porque o mercado era livre. A TAM não teria crescido em um mercado fechado. Agora, faz parte do jogo democrático discutir as regras, e a Anac tem feito isso muito bem. Isso é uma decisão de país, não de empresa.

ZH – O senhor assumiu a TAM em um momento negativo para a empresa, logo após o mais grave acidente da história da aviação brasileira e com a expectativa do surgimento de um concorrente muito forte, a Gol com a Varig. Quais foram as medidas tomadas para reverter esse cenário?

Barioni – O que nós fizemos foi fazer mais do mesmo com mais intensidade. A TAM tem excelentes fundamentos e sempre foi uma empresa de serviço, com a frota mais moderna do país. Se estamos entrando na aliança, foi por causa da gestão anterior do Marco Antônio Bologna. Se temos o 777 chegando, deve-se à negociação na gestão anterior. Para nós, o momento agora é de foco nas três excelências: excelência de serviço, excelência de técnico-operacional e excelência de gestão.

ZH – O senhor já conseguiu imprimir seu estilo na TAM? E o que o senhor trouxe da Gol para a TAM?

Barioni – Da Gol, não trouxe nada. Tenho 34 anos de carreira e sete anos de Gol. Então, na realidade, quem levou alguma coisa para a Gol foi ... enfim ... (encerra a frase antes de terminá-la). Eu trouxe a mim para cá, com muito carinho, e muito amor e a TAM me recebeu muito bem.

Fonte: Zero Hora

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