Em boa parte da sua história, a Embraer desfrutou o triunfo de estar sempre entre os maiores exportadores do país. Mas hoje a companhia sofre diante de um cenário inverso, com os principais clientes no exterior e em crise. Na Embraer, os planos para a vida depois dos 40 sustentam-se na esperança de que as linhas aéreas brasileiras comecem a interessar-se mais pelas rotas regionais, mercado em que a fabricante de aviões atua.
Criada no dia 19 de agosto de 1969, a Embraer acostumou-se a negociar no exterior. É de outros países que vinha o interesse pelos aviões menores, compatíveis com as viagens regionais. O resultado é que hoje a empresa vende para mais de 70 países. Mas somente 4% da sua receita - US$ 6,3 bilhões no ano passado - saem do Brasil, incluindo aí a área de defesa. Hoje a companhia ocupa a quarta posição entre os maiores exportadores do país, atrás de Vale, Petrobras e Bunge Alimentos.
Uma parte do sucesso no exterior também contou com um pouco de sorte. Quando começou a voar, em 1968, o Bandeirante, avião que fez a Embraer surgir, acabou pegando carona numa desregulamentação nos Estados Unidos. O mercado foi aberto justamente em um momento em que os americanos precisavam de aviões do porte do que era produzido no Brasil. A América do Norte ainda responde por 43% da receita da empresa brasileira.
Na história mais recente, antes de lançar as famílias de jatos 170 e 190, entre 2004 e 2005, a direção da Embraer conversou com 60 empresas aéreas do mundo. Quase todas do exterior, como a escandinava Finair e a francesa Air France. Quem conta a história é o presidente da companhia, Frederico Curado. "Queríamos saber como deveria ser o avião da próxima geração, em relação, por exemplo, às necessidades na distribuição interna e velocidade".
No Brasil, o interesse pelas rotas regionais começou a despontar somente no ano passado, com as primeiras encomendas da Azul e Trip. Curado diz ainda ter esperanças de que esse mercado cresça. No passado, empresas que não existem mais, como Vasp e Transbrasil, chegaram a comprar aviões da Embraer. Mas as duas que hoje dominam o mercado - TAM e Gol - possuem estratégia diferente, voltada aos grandes jatos, por entender que não se justifica manter voos diretos entre cidades menos frequentadas pelos que viajam de avião.
E se a Embraer entrasse, então, para o mercado dos grandes jatos? No que diz respeito à tecnologia, não falta à fabricante brasileira "ousadia e coragem", como diz Curado. Mas, além dos altos investimentos que teriam de ser feitos, inclusive na instalação de hangares de novos tamanhos, um passo desses significa ter de competir com as gigantes Boeing e Airbus, que têm, cada uma, tamanho dez vezes maior do que a brasileira. Trata-se de um mercado extremamente competitivo, ainda mais em tempos de crise. "Um movimento desses tem de ser muito bem pensado", acrescenta.
A Embraer chega aos 40 anos com 15 anos de privatização. Com o conhecimento de quem trabalhou na empresa antes e depois da privatização, Curado, funcionário da Embraer há 25 anos, destaca a combinação das duas fases. Para ele, como estatal, a companhia destacou-se pelo desenvolvimento de "uma cultura aérea sólida". Já a privatização adicionou a capitalização necessária. "Como empresa privada conseguimos uma gestão mais flexível, voltada para o cliente."
Foi como estatal que a Embraer lançou-se à globalização. Mas é como uma companhia privada que agora adota processos de trabalho do mundo globalizado, como o trabalho contínuo de redução de despesas e de desperdícios.
Foi com essa visão que, diante do agravamento da crise, a direção da empresa decidiu reduzir o ritmo da atividade em 30% e em fevereiro demitiu 20% dos empregados. O impacto da última medida na opinião pública estendeu-se até o dia 10 deste mês, quando o TST deu ganho de causa à empresa no julgamento de uma ação do sindicato, questionando a legalidade das dispensas.
A redução do ritmo da atividade nessa empresa também teve impacto direto na cadeia de fornecedores, que se descapitalizaram com a queda das encomendas. Curado reconhece que essa cadeia enfrenta o problema de excesso de dependência de um único cliente. "Mas eu não posso comprar o que não preciso", afirma.
Neste ano, a Embraer vai perder a venda de 27 aeronaves. A maior parte da suspensão de pedidos - 25 aeronaves - afetará a fábrica que a empresa brasileira tem na China. Os outros dois cancelamentos foram feitos no Brasil por um cliente cujo nome Curado prefere não revelar.
Para o executivo, a diversificação da carteira dos fornecedores seria uma saída possível se a carga tributária fosse menos pesada. Curado defende um programa de incentivos governamentais como forma de atrair investimentos do setor. E cita como exemplo o México, que, mesmo sem um fabricante local de aviões, promoveu um programa de incentivos fiscais. Como resultado, comenta, a Bombardier, fabricante canadense e principal concorrente da Embraer, decidiu instalar uma unidade de montagem no México.
Com a redução no ritmo de atividade, a empresa também prevê uma receita menor para este ano. Curado espera um faturamento de US$ 5,5 bilhões, o que representará uma queda de 12,7% em comparação com o de 2008. Por isso, no seu aniversário de 40 anos, a Embraer adota uma postura mais conservadora. O volume de investimentos para este ano já foi reduzido dos US$ 450 milhões inicialmente previstos para US$ 350 milhões.
Para Curado, tanto os fabricantes de aeronaves como as companhias aéreas do mundo devem preparar-se para enfrentar uma crise que não terminará antes de 2012. "A crise ainda é grave, mas vamos atravessá-la e sobreviver", afirma.
Fonte: Valor Econômico
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