20.10.11

Desatando o nó aeroportuário de São Paulo


por Érico Santana

(Graduado em Engenharia Civil pela Universidade Federal de Campina Grande (UFCG) e mestre em Engenharia de Infraestrutura Aeronáutica pelo Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA). Consultor da Organização Internacional da Aviação Civil (ICAO) alocado no Instituto de Controle do Espaço Aéreo (ICEA/DECEA) entre 2002 e 2007. Consultor em Planejamento Aeroportuário em Abu Dhabi, nos Emirados Árabes Unidos desde 2007.)

          A infraestrutura de transporte aéreo brasileiro sofre pressão contínua e crescente, especialmente aquela que atende a cidade de São Paulo. A metrópole de São Paulo se destaca no cenário brasileiro como a grande geradora de movimentos de tráfego do País. Seus aeroportos evidenciam esgotamento de capacidade, com enormes transtornos causados por congestionamentos nas horas-pico. A demanda se elevará ao longo dos próximos anos com o aumento da atividade econômica no País tornando o desafio ainda mais complexo de ser gerenciado e sobretudo solucionado.

            O crescimento da demanda por vôos comerciais regulares, o crescimento da aviação executiva em São Paulo, a localização de Campinas a 100 Km da capital, configuram-se como alguns dos elementos que justificam a urgente discussão sobre a instalação de um novo aeroporto para a Região Metropolitana de São Paulo (RMSP), e assim, atender este crescimento de forma sustentável.

            Os requisitos técnicos atuais convergem para a instalação adequada do aeroporto num raio máximo de até 50 quilômetros do centro de São Paulo. Esta abordagem alia diferentes aspectos, desde urbanísticos, sociais, econômicos, de utilização do solo e ambientais até os mais técnicos, como impacto das operações de novas aeronaves, emprego de novas tecnologias aeronáuticas e de controle do espaco aéreo nas áreas do seu entorno.

            Para se proceder a instalação do aeroporto, é necessária a prévia reestruturação dos fluxos na Área Terminal Sao Paulo (TMA-SP) de forma a permitir a inserção das operações da nova infraestrutura. Ressalta-se que tem sido apontadas limitações de ordem operacional dentro da TMA-SP, como obstáculos à construção de novas infraestruturas aeroportuárias, elementos essenciais no auxílio da resolução do problema.

            Embora deva ser observada a existência de restrições quanto o aumento da capacidade do tráfego aéreo na TMA-SP, percebe-se que muito do problema ainda não foi abordado sob a ótica das melhores técnicas, tanto no planejamento das rotas de chegada (STAR) e saídas (SID), da evolução do movimento dentro dela sob regras regidas por instrumentos que auxiliam o voo (IFR), quanto no gerenciamento do controle de tráfego. Todas essas opções devem ser efetivamente analisadas, exaustivamente e em conjunto com o emprego e utilização das novas tecnologias, amplamente disponibilizadas e conhecidas pelos profissionais do meio, de maneira coordenada e muito bem estabelecida.

            É  importante frisar ainda que, sob o ponto de vista da circulação dentro da TMA-SP, há uma tendência natural de se indicar o setor Norte ou Noroeste da TMA-SP como sendo o mais adequado para a instalação de um novo aeroporto, fato este que direciona por onde a análise deve ser iniciada. Isto é justificado de maneira categórica devido a concentração de um maior número de voos com destino e chegada relacionados ao Rio de Janeiro e as regiões Norte e Nordeste do Brasil. Estas regiões encontram-se mais próximas dos fixos de entrada e saída destes voos, razão esta pela qual é considerada a mais propícia para a implementação de nova infraestrutura aeroportuária.

            Esta constatação também foi submetida ao rigor científico, pois os especialistas Dr. Cláudio Jorge Alves, Alexandre Bastos e Derick Baum, em seu trabalho: Análise de  Viabilidade Operacional da Inserção de um Novo Aeroporto na Área de Controle Terminal de São Paulo apresentado no Simpósio de Transporte Aéreo promovido pela Sociedade Brasileira de Pesquisa em Transporte Aéreo em 2008, confirmam a mesma possibilidade.

            Constata-se, no entanto, que o crescimento contínuo da demanda não vem sendo acompanhado da contrapartida de infraestrutura necessária exigida pelo setor. As poucas soluções apresentadas, quando focadas no planejamento de médio e longo prazos, têm sido escassas ou geralmente muito simplistas. Neste aspecto,  o Departamento de Controle do Espaço Aéreo (DECEA), com o apoio adequado, tem condições de oferecer soluções rápidas.

            A tarefa de replanejamento do tráfego aéreo na TMA-SP, com a admissão de um novo aeroporto, coordenada pelo DECEA, é perfeitamente possível, já que em diversas regiões de multi-aeroportos no mundo, o problema foi solucionado com a aplicação de tecnologias mais atualizadas e melhor gerenciamento.

            No aeroporto de Guarulhos, verifica-se que duas novas instalações (terceiro terminal e terceira pista Norte) são itens relevantes ao sucesso da operação, principalmente quanto a seu potencial de expansão. Resultariam melhorias do sistema como um todo, evitando maiores atrasos nas operações, uma sensível melhora no nível de serviço dos terminais, hoje em níveis abaixo do desejável de acordo com a IATA (referência mundial).

            No entanto, a construção da terceira pista Norte é inviabilizada pelo elevado valor das indenizações e pelo alto custo social do deslocamento de um número elevado de famílias. Sem a terceira pista, inevitavelmente o gargalo se ampliará, ainda que se adote as últimas tecnologias quanto à aproximação de aeronaves. Este gargalo deve-se à concentração das operações na pista 09 (80-85% das operações do aeroporto), o qual será intensificado com a entrada em operação do terminal 3 (TPS3) sem a terceira pista.

            Com relação ao Aeroporto de São Paulo – Congonhas, próximo ao centro financeiro da cidade, é um dos aeroportos brasileiros de maior tráfego aéreo doméstico. Nele, se aplicam rígidos critérios de concessão de slots de forma a gerenciar a oferta de serviços fente às suas limitações de capacidade. Encontra-se impossibilitado para expansões futuras e enfrenta fortes resistências da população no seu entorno quanto a ampliações.

            Estes limitantes da TMA-SP, em caso de eventos inesperados, tais como a piora nas condições meteorológicas, se agravam irremediavelmente, como apontado no relatório BNDES/McKinsey, de 2010. Assumindo a hipótese da impossibilidade de expansão de Congonhas, qual o máximo de passageiros que se processaria a mais com a terceira pista em Guarulhos? O relatório citado, aponta entre 13 e 17 milhões de passageiros/ano. Estima-se que o atual sistema de pista aceita 35 milhões de passageiros/ano, entretanto este número é bastante questionável devido a configuração física dos sistemas de pistas de táxi com o pátio. Além dos gargalos existentes, o Aeroporto de Guarulhos já se encontra supersaturado, pois opera mais de 26 milhões de passageiros/ano (Infraero, 2010).

            O relatório do BNDES/McKinsey também aponta: "Os investimentos na construção do TPS 3, implantação da terceira pista Norte e reforma do sistema de pista-pátio tornariam Guarulhos um aeroporto equilibrado. Isto significa que sua capacidade de movimentação de aeronaves e passageiros não sofrerá modificações expressivas com a construção do terceiro terminal”.

            O fato evidencia a necessidade de um novo aeroporto para absorver o excedente de, pelo menos 17 milhões de passageiros/ano, no curto prazo. A justificativa é bastante para a construção de um novo aeroporto na Região Metropolitana de São Paulo (RMSP), somado aos outros motivos previamente apresentados e à expectativa de demanda de mais de 120 milhões de passageiros/ano em 2030. Sem um novo aeroporto nos próximos anos, São Paulo começará a perder parte de sua pujança econômica.

            Tendo em vista o já exposto, a apresentação de soluções no médio e longo prazos se fazem urgentes neste momento, em que o País realiza a concessão de aeroportos, o que certamente trará agilidade à gestão aeroportuária. Entretanto, as propostas atuais solucionarão momentaneamente alguns limitantes, não todos. A verdadeira solução passa pela construção do novo aeroporto na RMSP.

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