1.7.15

Transporte Aéreo – Capacidade Operacional e Níveis de Serviço

(por Luiz Carlos de Avellar Jr)

1ª Parte – o Valor do Tempo

"Tempo percebido, tempo psicológico, tempo mental, tempo pessoal, tempo subjetivo, tempo social e tempo cultural são algumas das denominações utilizadas para diferenciar o tempo humano do tempo físico, absoluto, Newtoniano, cronológico" (Morello, 1993, p. 31).

A medida cronológica (tempo) representa um papel não apenas importante, mas essencial no registro histórico, na organização diária e no agendamento de viagens, fundamentando o entendimento do planejamento, da velocidade e da eficácia dos diversos modais de transportes. Entretanto, outras formas de medição do tempo devem ser reconhecidas para contextualizar as experiências vividas entre deslocamentos, como por exemplo, os efeitos do tempo biológico, diurno ou noturno, nos fenômenos sazonais dos transportes, na conceituação do futuro, linear ou não-linear, nas considerações da variabilidade e ritmos nos fluxos da mobilidade e, finalmente, no reconhecimento do valor econômico do tempo (Baaijens e Nijkamp, 1999).

Invariavelmente o tempo é observado como um atributo passivo ou dimensão utilizada para descrever a cronologia de um fenômeno. Entretanto, o tempo pode também possuir um significado econômico mais direto e articulado em consideração ao desempenho das atividades humanas, baseado num gerenciamento deliberado e pessoal, sujeito à escassez como outro recurso qualquer (Morello, 1993). A seguinte citação reflete claramente este pensamento: "em lugar de ser um 'recipiente' no qual ação humana se desdobra, a existência humana é que está temporariamente em ação" (Thompson, 1994); ou como diz a sabedoria popular nordestina, com relação ao valor e a necessidade da gestão eficiente do tempo: “o tempo corre, voa como se tivesse asas, e pra quem espera por fartura o tempo é sempre uma cuia bem rasa”. 

Estas características de escassez e articulação do tempo são de importância decisiva para o comportamento humano contemporâneo, quando a competição por mercados torna a eficiência temporal imprescindível para a produção de bens e serviços competitivos.

Todas as atividades econômicas se desenvolvem com o tempo como referência e, portanto, devem possuir uma eficiência temporal. De forma análoga, qualquer viagem consome um determinado tempo, um tempo imperioso, e que, usualmente, não pode ser utilizado de outra forma. Assim, dentro do conceito de eficiência temporal, viajar, como um deslocamento espacial necessário a diversas atividades humanas, deve acontecer no menor intervalo de tempo possível, principalmente quando se considera as externalidades negativas deste deslocamento, e quando quase sempre se opta, naturalmente, por velocidades mais elevadas em todas as modalidades de transporte. 

Formas alternativas de utilização do tempo de um indivíduo, por exemplo, em atividades distintas de sua utilidade cotidiana, serão normalmente induzidas a obtenção de um nível de utilidade pessoal mais elevado, de forma que o tempo passe a possuir um valor extraordinário num contesto de escassez. Esta abordagem econômica sobre o tempo se reflete em vários estudos clássicos de gerenciamento do tempo, como Becker (1965), De Serpa (1971), Szalai (1972), ou Winston (1982), e em particular em estudos de valoração do tempo, em pesquisas de transporte, como Downes e Emmerson (1983), Jara-Diaz (1990), Supernak (1992) ou Small (1992), e mais recentemente no Brasil com Santana (2002), Hupalo (2003) e, mais recentemente, Guedes et al. (2005).

De uma forma geral, para qualquer indivíduo que se encontra entre deslocamentos, parece haver um alto grau de disposição em pagar para obter algum tempo extra em qualquer outra atividade, profissional ou de lazer. Este anseio de economia de tempo se manifesta na busca permanente pelo incremento da velocidade em qualquer modal de transporte. Não obstante, este fato se sucede muitas vezes sem nem mesmo considerar que esta tendência universal pode trazer consequências adversas ao desenvolvimento sustentável ou à segurança operacional dos transportes (Fergusson, 1994, apud Baaijens e Nijkamp, 1999).

Contudo, o conceito do valor econômico do tempo é ainda uma questão incipiente para os países em desenvolvimento, onde a necessidade do compromisso com a manutenção de horários e pontualidade continua a ser menosprezada por trabalhadores, empresários e governantes. Em contrapartida, em países desenvolvidos, onde a cultura do valor do tempo já foi a muito estabelecida, em todos os setores da sociedade, abordagens convencionais são comumente utilizadas para estimar o valor do tempo nas mais diversas atividades humanas.

Esta quantia, para os usuários de transportes, assume geralmente, como referência, o valor equivalente de horas trabalhadas por um indivíduo, posto que a maioria de seus cidadãos possui trabalho formal e recebe salários proporcionais ao tempo dedicado às suas funções profissionais. Por outro lado, as empresas prestadoras de serviços de transporte estão constantemente perseguindo a melhor utilização temporal de seus veículos e recursos, numa incessante busca por uma melhor gestão de capacidade operacional, que invariavelmente contribuem para uma imponderável redução em seus custos operacionais. 

Por outro lado, como forma de contribuição para diretrizes político-administrativas, os resultados de pesquisas e avaliações do valor econômico do tempo subsidiam tomadas de decisões para investimentos em infraestrutura, serviços e tecnologia, inclusive no setor de transportes. Desta forma, torna-se público e notório que a má gestão da capacidade operacional, assim como o subsecutivo desperdício de tempo entre deslocamentos acarreta prejuízos a usuários e operadores de transporte, sempre proporcionais aos atrasos ou quedas na qualidade dos serviços verificados. 

Nos últimos anos um dos avanços mais significativos no modo como países e empresas, líderes econômicos, gerenciam suas ações e estratégias competitivas tem sido, exatamente, o enfoque no tempo, relacionando este fator com a respectiva produtividade. O combate ao desperdício de tempo não só conduz a respostas mais rápidas a necessidades específicas, como também pode resultar na redução de custos e em maior flexibilidade operacional. 

Pode-se aqui fazer a analogia do oleoduto, ou seja, quanto mais longo o oleoduto, desde a refinaria até um distante mercado consumidor, mais lento será o processo de reação às mudanças nas exigências daquele mercado. Ao mesmo tempo, quanto mais longo o oleoduto, mais óleo ele contém e, consequentemente, maior o capital de giro nele estará empatado (J. Arruda, 1996). 

Para o início do século XXI o slogan “Tempo é Dinheiro” pode parecer um antigo clichê, mas nunca fez tanto sentido como no mercado competitivo e globalizado em que vivemos hoje. A permanente preocupação relacionada à produtividade, com relação aos aspectos do desempenho econômico no combate ao desperdício de tempo, é perfeitamente traduzida pela expressão mencionada acima, ao menos é desta forma que os países desenvolvidos gerenciam seus negócios. 

Mas, usualmente, nos países em desenvolvimento é apenas o valor dinheiro, e não também do tempo, que inadvertidamente mantêm-se sob controle. Utiliza-se normalmente o dinheiro para valorar nosso trabalho, status social e tudo que investimos, compramos ou produzimos. Mas mesmo que o dinheiro tenha se transformado, ao longo dos últimos séculos, numa medida universal de valor, ainda permanece um conceito impreciso. Afinal, além do fato de que cada produto ou serviço possa obter um valor geograficamente diferenciado, a própria medida de inflação transforma o dinheiro num padrão elástico em relação ao tempo, tornando inclusive a evolução temporal de seu valor numa avaliação de desempenho econômico. 

Outra sabedoria popular afirma que o tempo é sempre o senhor de todas as mudanças e, portanto, precisa ser considerado nas avaliações de desempenho de qualquer atividade econômica e, nos aspectos que se relacionam ao coerente planejamento para o transporte aéreo, onde o menor tempo de viagem representa um valor ainda mais pertinente para usuários e transportadores, afinal, a opção por este modal de transporte se faz exatamente, entre outras razões, por sua maior velocidade. 

“[...] Não há, portanto, um tempo dos filósofos; apenas existe um tempo psicológico diferente do tempo dos físicos”.

(Albert Einstein)

por Luiz Carlos de Avellar Jr, em 01.07.15


* - Luiz Carlos de Avellar Jr é Engenheiro formado pela UFF, Mestre em Engenharia de Transportes pela UFRJ (com foco de pesquisa na área de Planejamento de Transportes); trabalhou entre 1986 e 2008 no DAC/ANAC, mais especificamente no Instituto de Aviação Civil – IAC. Atualmente é Diretor Técnico do Instituto Nacional para o Desenvolvimento Espacial e Aeronáutico – IDEA, além de prestar consultorias individuas nacionais e internacionais, 56 anos, pai (Luiza 26 anos / Juliana 24 anos / e Antônio 3 anos...), casado, carioca e tricolor... e também apaixonado pela Aviação Civil.

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