14.3.17

A polêmica das Bagagens... (três matérias interessantes)



Na estreia da norma de bagagem, só uma empresa dará desconto
Queda nos preços dos bilhetes era principal argumento da Anac para mudança

As novas regras para transporte de bagagem em voos nacionais e internacionais devem entrar em vigor nesta terça-feira, em meio a ações na Justiça que ainda podem levar a reviravoltas de última hora. Mesmo que as contestações judiciais não vinguem, poucas serão as mudanças imediatas para o passageiro. Das quatro grandes companhias aéreas brasileiras, apenas a Azul oferecerá passagens mais baratas, com desconto para quem não despachar mala, no primeiro dia de vigência das normas. E apenas para 14 destinos. Promover a queda nos preços dos bilhetes é o principal argumento da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) para justificar a mudança. Para especialistas, é possível que isso aconteça a médio prazo. Órgãos de defesa do consumidor, porém, avaliam que o viajante será prejudicado. As normas valem apenas para passagens emitidas a partir de 14 de março. Para quem vai embarcar no fim do ano, mas já comprou a passagem, nada muda.

São várias as regras que devem ser implementadas a partir de 14 de março, como previsto na resolução 400 da Anac. A principal e mais polêmica é a possibilidade de as empresas cobrarem por bagagem despachada — a de mão permanece gratuita e terá o volume atual de até 5Kg elevado para ao menos 10Kg sem custo. Hoje, em voos domésticos, o passageiro pode levar uma mala de até 23Kg sem custo adicional. Nos voos internacionais, são duas malas de 32Kg. Governo e empresas alegam que, na verdade, o custo do transporte está embutido no preço da passagem e que, hoje, todos pagam por isso, mesmo aqueles que só viajam com a roupa do corpo. Dizem que, ao cobrar pela mala despachada, haverá mais transparência na relação com o cliente e que a tendência é que o valor médio do bilhete caia.

GOL AVISOU QUE TARIFAS CAIRÃO NO MÊS QUE VEM

Ao menos duas ações na Justiça tentam barrar a mudança: uma da Ordem dos Advogados do Brasil e uma do Ministério Público Federal em São Paulo, ajuizada na quinta-feira passada. As instituições argumentam que a norma fere o Código Civil e o Código de Defesa do Consumidor. No primeiro caso, o código prevê que transporte aéreo estende-se a pessoas e bagagens. Dissociá-los, portanto, seria uma violação, dizem OAB e MPF. No segundo caso, a alegação é que a mudança levaria a um aumento injustificado no preço do serviço prestado pelas aéreas, uma vez que haverá cobrança por algo que hoje não tem custo aos olhos do passageiro.

Se a Justiça não se manifestar sobre o assunto hoje, as novas regras valerão para quem emitir passagens a partir de amanhã. Para quem vai viajar no fim do ano e já tem bilhete comprado nada muda. Mas pouco muda também para quem ainda vai reservar um voo. Assim como a Azul, a Gol terá tarifa reduzida para quem viajar apenas com bagagem de mão, entretanto, a mudança só estará disponível a partir de 4 de abril. As tarifas atuais, que permitem despachar malas sem custo, serão mantidas pelas duas empresas em voos no Brasil e no exterior. Já a Latam informou que vai cobrar pela bagagem despachada (a partir de R$ 50 por mala em viagens nacionais), mas que, nos primeiros meses, o serviço continuará gratuito “para ajudar o cliente a se adaptar a esta nova dinâmica”. A Avianca ainda vai estudar as regras antes de definir sua política de preços.

Para Alessandro Oliveira, professor do Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA), a tendência é que as tarifas caiam a médio prazo:

— A curto prazo, as empresas ficam com pé atrás se vão cobrar pela bagagem. Mas quando isso entrar na linguagem do passageiro, aí passarão a cobrar de fato, e as tarifas básicas tendem a cair.

Guilherme Amaral, especialista em Direito Aeronáutico do ASBZ Advogados, avalia que Latam e Avianca “vão se mexer” e deverão criar um perfil diferente para quem viajar apenas com bolsa de mão. Juntas, Gol e Azul têm 57% do mercado doméstico, segundo dados da Anac de janeiro. Ele frisa, porém, que tarifa reduzida não significa necessariamente preços menores que os praticados hoje:

— É o mercado que diz o quanto as pessoas estão dispostas a pagar pela passagem. Se duas pessoas comprarem juntas uma passagem para o mesmo destino, partindo do mesmo lugar e uma vai despachar mala e outra não, quem não despachar vai pagar menos. Mas há outras variáveis. Se a procura for grande por esse destino dois meses depois, se o preço do petróleo subir, não será o despacho da mala o responsável pelo aumento do preço.

Além do Brasil, China, Rússia e Venezuela também regulam a franquia de bagagens. Anac e Iata, associação que reúne as principais companhias aéreas do mundo, dizem que os preços das passagens caíram nos mercados onde houve liberalização da franquia, mas não têm estudos que mostrem o quanto caiu. Para Carlos Ebner, diretor da Iata no Brasil, o fim da franquia é mais uma etapa de um processo que começou em 2001, com a liberdade tarifária para as aéreas brasileiras. Até então, havia piso e teto para o preço das passagens. Naquele ano, a tarifa média girava em torno de R$ 670. Em 2015, havia caído à metade (R$ 334,50).

— Em todos os países onde houve tarifas mais flexíveis, houve crescimento do setor. No Brasil, a aviação civil responde por 1,7% do PIB (Produto Interno Bruto) — diz Ebner.

SE PREÇO NÃO CAIR, CÂMARA PODE ANULAR REGRA

A desregulamentação das franquias ocorre em um cenário de prejuízos bilionários das empresas acumulados nos últimos anos. Para alguns especialistas, a mudança deve contribuir para o aumento da receita auxiliar, aquela que vem da cobrança pela marcação de assento, do serviço de bordo e outros serviços que já foram gratuitos no passado.

— A situação está muito ruim para as aéreas. É possível que o preço médio da passagem caia, mas acredito que, na prática, estão criando um subterfúgio para o aumento da tarifa no futuro — afirma Jorge Leal Medeiros, professor de Transporte Aéreo da Escola Politécnica da USP.

Caso o preço das tarifas não caia, o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), afirmou que deve seguir o Senado e aprovar a proposta de decreto legislativo que anula a desregulamentação da bagagem. Os demais itens da resolução da Anac seriam mantidos, como a correção de nome na passagem sem custo e a garantia do voo de volta, mesmo que o passageiro perca o voo de ida. A advogada do Idec Claudia Almeida diz que as mudanças beneficiam o consumidor. Mas considera a cobrança por bagagem despachada um erro:

— É uma ilegalidade. O Código Civil prevê que o transporte de bagagens está contemplado no serviço de transporte aéreo, não sendo possível dissociá-lo do transporte de pessoas. E, pelo Código de Defesa do Consumidor, haverá aumento injustificado de preço, pois hoje você tem um preço para dois serviços (transporte de pessoas e bagagem) e terá o mesmo preço para apenas um serviço.

Fonte: O Globo (http://oglobo.globo.com/economia/na-estreia-da-norma-de-bagagem-so-uma-empresa-dara-desconto-21050339)

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14 de Março: Dia Nacional da farra das Companhias Aéreas
(Por Léo da Silva Alves)

"A polêmica decisão que autoriza empresas aéreas a cobrar por bagagem faz parte da inusitada política de prestigiar poderosos grupos econômicos em desfavor da população. O governo não tem a mesmo empenho em socorrer os 100 mil empresários anônimos que fecharam as portas nos últimos meses.

Dia 14 deste mês começam as valer as regras da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) com a autorização para empresas aéreas cobrarem pela bagagem despachada pelos passageiros nos voos nacionais e internacionais. É um acinte à realizada do país, ao momento econômico que encolhe o poder aquisitivo das pessoas e um contrassenso, na medida em que favorece grupos econômicos que são campeões em lesar consumidores, além de lograr os órgãos e entidades oficiais.

Aponte-se que somente a Infraero tem a receber mais de R$ 2 bilhões de companhias aéreas caloteiras. Entre os seis maiores devedores da Previdência Social três são exatamente essas empresas que no passado viviam de sucessivos socorros do Governo Federal. As corporações quebraram, os proprietários continuaram ricos e o INSS deixou de arrecadar uma considerável fortuna. No momento, sabe-se que o BNDES mostra-se preocupado com dívidas acumuladas pelas principais empresas que estão em operação no país. Curiosamente, nem governo nem bancos oficiais mostram-se comovidos com os mais de 100 mil estabelecimentos comerciais que fecharam as portas nos últimos meses, nem com os 12 milhões de desempregados que perambulam nos centros urbanos na procura de uma vaga para garantir o sustento básico da família.

O favorecimento das companhias pela autorização de cobrança de bagagem está na contramão do que o país precisa: eficiência dos órgãos de regulação e o afastamento da mania de acariciar quem não se ajusta ao sistema. “Quem não tem competência não se estabelece”, é a regra primária no meio corporativo. Transferir à parte hipossuficiente as consequências de administrações temerárias, ou passar para os cidadãos o custo de fatores externos que não lhes dizem respeito são inversões de valores em se tratando de política de governo.

O Sistema aeroviário no Brasil

Aproveite-se o infeliz contexto para uma rápida análise do nosso aeroviário.

A principal parte de um aeroporto é aquela que o passageiro não vê: pistas, pátios, áreas de taxiamento e sistemas de navegação aérea. Nesses segmentos, ainda há considerável defasagem. O número de passageiros multiplicou nos últimos anos, mas esses componentes essenciais às operações aeroviárias estão praticamente estagnados desde 2007.

Levando-se em conta apenas a realidade das pistas de pouso e decolagem, tem-se um mapa preocupante. As pistas mais longas estão no Galeão (4.000 m), em Guarulhos (3.700 m), Campinas (3.240 m), Recife (3.007 m), Salvador (3.003 m) e Confins (3.000 m). Com espaços reduzidos operam Congonhas (1.940 m), Santos Dumont (1.323 m), Porto Alegre (2.280 m) e Curitiba (2.215 m) – extensões inadequadas, dizem os especialistas.

Considerando-se os dez mais movimentados aeroportos dos Estados Unidos, cada um deles tem pelo menos uma pista com 4.000 metros; e a quantidade de espaços também há que se considerar: Atlanta tem cinco pistas; Dallas possui sete. Dos 17 aeroportos que serviram às cidades-sedes da Copa do Mundo de 2014, nove tem apenas uma pista de pouso e decolagem.

A segurança aérea no país foi oficialmente considerada equivalente aos países em guerra. O enquadramento como criticamente deficiente (Critically Deficient) foi feito em 2016 pela IFALPA (International Federation of Air Line Pilots Association), uma associação de pilotos vinculada à ICAO, agência especializada em aviação da Organização das Nações Unidas. Essa situação foi referendada em relatório da Associação Internacional de Transporte Aéreo (IATA), que representa as principais empresas aéreas do mundo.

Os terminais de passageiros têm recebido consideráveis melhorias, principalmente nos aeroportos gerenciados pela iniciativa privada. Mas, pelas suas peculiaridades, são locais de longas esperas. Em algumas capitais os passageiros se espremem em ambientes de completo desconforto e, por falta de estrutura ou organização, são submetidos a extensas filas, que se repetem a cada procedimento (impressão do bilhete, despacho de bagagem, entrada na área de embarque, controle de Raio X, acesso à aeronave etc.) Uma situação complexa para idosos e pessoas com mobilidade restrita. Pesquisa realizada pela Universidade de São Paulo, com a equipe de São Carlos, constatou o “despreparo de aeroportos brasileiros para atender passageiros com deficiência física ou visual e estrangeiros”. É certo que os terminais do país, no geral, não estão no ranking dos piores do mundo, o que não significa que sejam dispensadas providências. Há o que fazer para compatibilizar os terminais de passageiros ao aumento da demanda e torná-los confortáveis e seguros, como o são os mais bem avaliados de todos os continentes. Essa, aliás, é uma das primeiras necessidades dentro de um projeto de fomento real à indústria limpa do turismo.

No que tange à atividade de controle dos serviços, há o que questionar quanto à sua efetividade. A Anac (Agência Nacional de Aviação Civil) – a mesma que autorizou a cobrança por bagagem despachada – seria uma entidade reguladora independente, com atribuições, entre outras, de zelar pelo interesse dos usuários. Como defensora do público que utiliza o sistema de transporte aéreo de passageiros, a agência tem sido acionada judicialmente pelo Procon exatamente por não fiscalizar e coibir abusos, como a comercialização em preços extorsivos de passagens em períodos de alta demanda, como aconteceu na Copa Mundo.

É notório que a autarquia serve muito bem ao compadrio político. Nos cargos mais relevantes, há históricos de parlamentares não reeleitos e até genro de senador – o que obviamente não condiz com a administração profissional e independente como preceitua a própria lei de criação, Lei nº 11.182, de 27 de setembro de 2005. No art. 4º o estatuto preceitua: “A natureza de autarquia especial conferida à Anac é caracterizada por independência administrativa, autonomia financeira, ausência de subordinação hierárquica e mandato fixo de seus dirigentes”.

Nem a Infraero, estatal que administra a maior parte dos aeroportos do país, obedece às regras de regulação, tal o desprestígio da agência. De todas as multas que recebeu nos anos de 2010 a 2012, deixou de pagar 95%.

O modelo de regulação atende a um formato moderno, mas a modernidade passa, sobretudo, por gestão profissional, o que pode começar com a valorização dos quadros técnicos da entidade. É preciso dispensar o aparelhamento, o rotineiro uso político dos cargos de relevo, e enfrentar eventuais sucumbências ao lobby de interesses nem sempre republicanos. Somente uma estrutura que não esteja ligada a partidos, que não tenha compromisso com padrinhos, que seja formada por especialistas e recursos humanos comprometidos – e a agência certamente os tem ou pode ter –, é capaz de realizar o trabalho de normalização e fiscalização de um setor de tamanha complexidade.

*Léo da Silva Alves é jurista radicado em Brasília e conferencista especializado em responsabilidade de agentes públicos (leoalves@terra.com.br).

Fonte: https://paraibaonline.com.br/colunistas/14-de-marco-dia-nacional-da-farra-das-companhias-aereas/

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Com a mão no bolso dos passageiros
(por Claudio Lamachia, Advogado e presidente nacional da OAB)

"Desde o final do ano passado embarcamos em um debate sobre a regulamentação por parte da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), que permitirá a partir de 14 de março a cobrança pelas companhias aéreas pelo despacho de bagagens.

A normatização, segundo a Anac, proporcionará a redução do custo dos bilhetes aos usuários, algo que desde o início questionamos, pois como a experiência nos tem demonstrado ao longo dos anos, o consumidor raramente vê as medidas beneficiarem seus bolsos.

Dias atrás uma entrevista do presidente de uma companhia aérea, negando a possibilidade de redução do preço das passagens, demonstrou claramente que a Anac "esqueceu de combinar com os russos" a redução dos valores, deixando exposto o óbvio: não há interesse algum das aéreas em baixar preços, apenas aumentar a arrecadação.

Exatamente por isso a OAB foi a judiciário, buscando suspender os efeitos da norma, por entender que há ferimento evidente ao direito dos consumidores. O fato é apenas mais um que nos faz questionar o real papel das agências reguladoras no país.

Vivemos o surrealismo de nos deparar com propostas de redução de direitos aos consumidores, como se as agências fossem verdadeiros sindicatos representantes dos grandes grupos empresariais.

Exemplos não faltam: Anatel pretendendo que os pacotes de internet sejam limitados, permitindo bloqueio da internet aos assinantes; Anac querendo autorizar a cobrança por bagagens, Aneel autorizando o aumento das contas de energia para indenizar as concessionárias que fizeram investimentos para a melhoria do próprio sistema; além das companhias de água e esgoto que mesmo sem qualquer investimento, ampliam seus preços livremente, isso para não falar do péssimo atendimento dos clientes de planos de saúde, do aumento dos combustíveis, etc. Todos serviços regulados por agências públicas.

O papel das agências reguladoras brasileiras merece ser objeto de uma análise profunda. Em sua maioria, elas não têm cumprido o real papel para o qual foram criadas, revelando-se, muitas vezes, meros espaços para aproveitamento de apadrinhados políticos.

Os valores da democracia e da República impõem uma necessária separação entre o que é público e o que é privado. Dificilmente alguém argumentará abertamente contra essa concepção saudável de Estado. Mas é preciso muito trabalho para fazer esses valores serem aplicados na prática."

Fonte: http://zh.clicrbs.com.br/rs/opiniao/noticia/2017/03/claudio-lamachia-com-a-mao-no-bolso-dos-passageiros-9745530.html

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